23- Oração e Restauração
por Reinaldo Bui Está alguém entre vocês sofrendo? Ore. Está alguém feliz? Cante louvores. Há alguém doente entre vocês? Chame os presbíteros da igreja, para que estes orem sobre ele o unjam com azeite, em nome do Senhor. E a oração feita com fé curará o doente; o Senhor o levantará. E se houver cometido pecados, será perdoado. Portanto, confessem os seus pecados uns aos outros e orem uns pelos outros para serem curados. A oração de um justo é poderosa e eficaz. Elias era humano como nós. Ele orou fervorosamente para que não chovesse, e não choveu sobre a terra durante três anos e meio. Orou outra vez, e o céu enviou chuva, e a terra produziu os seus frutos. Meus irmãos, se algum de vocês se desviar da verdade e alguém o trouxer de volta, lembrem-se disso: Quem converte um pecador do erro do seu caminho, salvará a vida dessa pessoa e cobrirá uma multidão de pecados (Tg 5.13-20).
Chegamos ao fim. Mas não sem problemas, pois esta passagem reúne uma série de históricos mal-entendidos teológicos. Foi nestes versículos que a Igreja Católica baseou-se para instituir o sacramento da extrema-unção. Já no sec. III, havia o costume de ungir enfermos consagrando-os por um bispo. No séc. X a importância deste ato cresceu tanto que decidiu-se que seria feita exclusivamente por um sacerdote católico. No séc. XII surgiu a ideia da extrema unção e restringe-se aos fiéis que estão diante da morte iminente. No séc. XIII tornou-se oficialmente um dos sete sacramentos. Por fim, em 1545 o Concílio de Trento considerou anátema negar sacramento instituído por Cristo, inclusive este. Já na Igreja Evangélica, os pregadores da ‘cura pela fé’ acreditam que esta passagem é base para que o crente não permaneça enfermo, mas seja curado. Porém, na realidade, muitos “ungidos” em seus leitos permaneceram doentes e outros vieram a falecer. O que dizer diante de todas estas coisas? O que exatamente Tiago quis comunicar nestes versículos?
Observando este texto, logo de início podemos fazer três afirmações:
- Não há aqui nenhuma sugestão de óleo especial ou consagrado;
- Não é preparação para a morte, mas restauração para a vida;
- A ênfase não é em cura física nem remissão de pecados, mas cura espiritual e restauração de comunhão.
Recordando o contexto da carta, Tiago falou de perseverança na perseguição, dos erros de falar mal do outro, da exploração econômica, abordou a importância da paciência e agora fala de sofrimento (v.13) enfatizando a importância da oração. Tiago quer ensinar que o homem, pela oração, abre as portas para Deus agir. Note que dos versos 13 a 18, todos falam de orar, mais especificamente o papel da oração no cotidiano (que no caso deles incluía o sofrimento). Não somos exceção, embora as fontes e razões das nossas lutas sejam outras.
Neste caso, quem é o enfermo? A palavra usada para doente (astheneo) aparece 35 vezes no NT. Destas, 16 vezes se refere a doenças físicas, principalmente nos evangelhos, mas na maioria das vezes (principalmente nas epístolas) esta palavra descreve fraqueza espiritual e emocional. A julgar o contexto aqui, podemos concluir que se trata de pessoas que traziam o resultado da perseguição e maus-tratos, ou seja, fragilizadas emocional e espiritualmente. Não sou contra a ideia de Deus curar doenças físicas, mas acredito que agora não é o que está sendo tratado aqui. O debilitado e fraco que Tiago se refere está precisando do apoio pastoral e os presbíteros eram aqueles que cumpriam esta função na igreja. Os presbíteros deveriam orar pelo enfraquecido e ungi-lo com óleo. Na cultura hebraica, o óleo era empregado em algumas situações como o cuidado com o corpo na higiene pessoal (Mt 6.17). Também usava-se quando queria-se honrar um visitante (Mt 26.7; Lc 7.38, 46). Usava-se no preparo do corpo de um morto (Mc 16.1). Além destas, o óleo ainda desenvolvia importante função terapêutica (Mc 6.13).
Isto faz-nos pensar que quem estava fraco ou enfermo, estava por causa de maus-tratos, talvez com feridas e assim estes lhe ministrariam o medicamento disponível para seu bem estar. Nada havia nada de místico ou sobrenatural no uso do óleo naquela cultura (Lc 10.34), era meramente terapêutico. Também não há erro algum em se usar dos recursos da medicina - não se trata de incredulidade. Lucas era médico (Cl 4.14) e curava enfermos usando a medicina; Paulo indicara um medicamento a Timóteo (1Tm 5.23), e deixou Trófimo em Mileto por estar doente. Os presbíteros deveriam visitar os enfermos, ungi-los com óleo e orar. Esta ‘Oração de fé’, segundo Tiago 1.6-8, é uma oração feita por quem é fiel a Deus.
Além disto, Tiago diz que se houver cometido pecados, será perdoado. Considerando todo o contexto, é possível que neste estágio o enfermo tenha percebido que estava nesta situação porque agiu em desacordo com a vontade de Deus. Pecou por falta de fé estava sofrendo com isto. Note o que escreveu o salmista:
Enquanto calei os meus pecados, envelheceram os meus ossos pelos meus constantes gemidos todo o dia. Porque a tua mão pesava dia e noite sobre mim, e o meu vigor se tornou em sequidão de estio. Confessei-te o meu pecado e a minha iniqüidade não mais ocultei. Disse: confessarei ao SENHOR as minhas transgressões; e tu perdoaste a iniqüidade do meu pecado (Salmos 32:3-5).
O sofrimento faz parte do processo de Deus para nosso aperfeiçoamento, daí sua decisão de levar Deus mais a sério. Derrotado e abatido pelo sofrimento, ele pode pedir apoio dos pastores que orarão por ele e Deus restaurará a sua disposição espiritual. Desânimo na fé pode acontecer por diversas razões e às vezes conjuntas: pecados não tratados que minam nossas forças, males físicos que nos levam a questionamentos constantes, enfraquecimento da fé nas circunstâncias adversas, etc.
Há aqui em Tiago uma preocupação com cada um que esteja vivendo nestas condições, que possa ter o socorro necessário para o fortalecimento da sua vida cristã. Em maior ou menor escala o povo de Deus passa por isso: Elias ficou desanimado após uma batalha espiritual, João Batista ficou incrédulo na prisão, Pedro negou e abandonou ao Senhor, Davi se afastou em pecado, João Marcos abandonou uma viagem missionária por medo. O verso 19 alerta sobre a possibilidade algum dos irmãos se desviar da verdade, da mensagem do Senhor. Isso é possível que aconteça. Este irmão pode se ajudar orando por si e pode ser ajudado pelos pastores, mas note que toda comunidade deve estar voltada para o irmão mais fraco. Como corpo, devemos cuidar dos membros mais fracos.
Precisamos ter com quem compartilhar nossa fraquezas, e confessarmos os nossos pecados. Não somos uma comunidade de perfeitos. Talvez alguns de nós precise de oração por desânimo, medo, covardia. Pode ser que outros sofram tentações como rancor, mágoa, imoralidade, autocomiseração, etc. Confissão abre as portas para que o outro interceda por você, dando espaço para que Deus atue em sua vida. Saiba que você pode ser um agente de restauração, protegendo-o da sua perda de comunhão, do castigo do pecado, e ele será restaurado (v.20). Identificar um irmão em pecado é a oportunidade de agir em seu favor, seja orando, seja exortando. Caso o faça voltar, é um grande feito. Note que a súplica de um justo muito pode, tem grande poder. Você pode não ver, mas ‘sua eficácia’ (energeo), traduz a palavra que origina energia. Se aplicada aos problemas e sofrimentos, funciona. Oração de um justo, não significa de alguém perfeito, mas alguém que está buscando em tudo a vontade de Deus, e Deus atende (Jo 9.31). Tiago usa Elias como exemplo: era homem como nós. Não se tratava de um super-homem. Teve fome, medo e fugiu, ficou deprimido, mas quando ele orou, foi respondido. Ele estava pronto a fazer a vontade de Deus, fosse qual fosse. Abra a porta por sua oração e temor a Deus, para que Ele aja em sua vida e na de outros.
Tenha sempre nomes de pessoas por quem orar. Não passe pelas dificuldade sem dar a Deus a oportunidade de intervir. Identifique alguém com quem você possa compartilhar suas fraquezas para que ore por você. Deixe seus pastores saberem pelo que orar por você.
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