sexta-feira, abril 30, 2010

O que é Dispensacionalismo?

Professor: Luiz José de Almeida Gusmão. M. Teo
Fundador do Centro de Estudos e Pesquisas Bíblicas - CHAMADA BEREANA

Fonte: Leia Jornal


I - UMA DEFINIÇÃO
Está é uma boa pergunta para se começar! O que é o dispensacionalismo?  O Dr. Charles Ryrie, professor jubilado do Seminário Teológico de Dallas, é um notável porta voz do dispensacionalismo. Muitos conhecem o Dr. Ryrie através dos seus livros e artigos, porém ele é mais conhecido pela famosa Bíblia Anotada. O livro escrito por Ryrie, “Dispensationalism Today” (O Dispensacionalismo na Atualidade), ainda sem tradução em português, é um ponto de referência para a busca da definição de dispensacionalismo. Farei um resumo do seu conteúdo. O Dr. Ryrie assinala que The Oxford English Dictionary define uma dispensação teológica como: “um estágio na revelação progressiva, expressamente adaptado às necessidades de uma determinada nação ou de um período de tempo... também, a era ou período durante o qual um sistema predominou[1]”. O termo “dispensação”, em português, é uma tradução do substantivo grego oikonomia, muitas vezes traduzido pelo vocábulo “administração” em versões mais atuais da Bíblia. O verbo oikonomeo[2] se refere ao gerente administrativo de uma casa de família. Ryrie faz esta observação: “No Novo Testamento, o termo dispensação significa gerenciar ou administrar os negócios de uma casa de família, como, por exemplo, na história contada por Jesus sobre o administrador infiel registrada em Lucas 16.1-13.[3]

O Uso do Termo Dispensação nas Escrituras
A palavra grega oikonomia é uma aglutinação do termo oikos, que significa “casa”, com o termo nomos, que significa “lei”. Quando reunidos, “a idéia central do vocábulo dispensação é a de gerenciar ou administrar os afazeres de uma casa”.[4]

As várias formas da palavra dispensação ocorrem vinte vezes no Novo Testamento. O verbo oikonomeo é utilizado uma vez em Lucas 16.2 onde é traduzido por “ser um administrador”. O substantivo oikonomos é usado dez vezes (Lc 12.42; Lc 16.1,3,8; Rm 16.23; 1Co 4.1,2; Gl 4.2; Tt 1.7; 1 Pe 4.10), e em todos esses casos é traduzido por termos que evidenciam uma relação de economia doméstica, tais como: “mordomo, administrador, despenseiro, curador”, exceto no caso de Romanos 16.23, onde é traduzido por “tesoureiro”. O substantivo oikonomia ocorre nove vezes (Lc 16.2,3,4; 1 Co 9.17; Ef 1.10, Ef 3.2,9; Cl 1.25; 1 Tm 1.4). Nessas ocorrências é traduzido de várias maneiras (administração, responsabilidade de despenseiro, dispensação, serviço).


Características do Dispensacionalismo
Em um exame do termo grego oikonomos nos Evangelhos, descobre-se que Cristo usa essa palavra em duas parábolas no livro de Lucas (Lc 12.42; Lc 16.1,3,8). Ryrie registra que em Lucas 16 encontramos “algumas características importantes de uma administração ou de um acordo dispensacional”.[5] As características são as seguintes:

1 – Há, basicamente, duas partes interessadas, aquela que tem a autoridade de delegar tarefas ou deveres, e a outra que tem a responsabilidade de cumprir tais encargos. O homem rico e o administrador desempenham esses papéis na parábola de Lucas 16 (v.1).
2 – Essas são responsabilidades específicas. Na parábola, o administrador falhou em suas tarefas conhecidas ao desperdiçar os bens do seu senhor (v.1).
3 – Tanto a contabilidade, quanto a responsabilidade, fazem parte do acordo. Um administrador pode ser chamado a prestar contas pelo seu desempenho na administração a qualquer momento, pois do senhor é a prerrogativa de esperar obediência fiel por parte do administrador, quando às responsabilidades a ele confiadas. (v.2)
4 – Alterações podem ser feitas a qualquer momento que se constatar infidelidade da administração em exercício. (Presta contas da tua administração, porque já podes mais continuar nela).[6]

Mais algumas características podem ser coletadas em outras ocorrências do grupo de palavras relacionadas ao termo “dispensação”. Todos os outros usos, com exceção de 1 Pedro 4.10, são encontrados nos escritos de Paulo. Ryrie cita as seguintes características:

1. Deus é Aquele a quem os homens devem prestar contas pelo desempenho de suas obrigações de mordomia ou administração. Esse relacionamento com Deus é mencionado por Paulo em três ocasiões (1 Co. 4.1-2; Tt. 1.7).
2. A fidelidade é requerida daqueles que são encarregados de uma responsabilidade dispensacional (1Co 4.2). Isso é ilustrado no caso de Erasto, que desempenhava a importante função de tesoureiro (administrador) da cidade (Rm 16.23).
3. Uma responsabilidade de mordomia pode terminar num tempo determinado (Gl 4.2). Nessa referência, a curadoria chegou ao seu fim, em virtude da introdução de um propósito diferente. Esse texto também mostra que uma dispensação tem relação com o tempo.
4. As dispensações estão relacionadas com os mistérios de Deus, ou seja, com uma revelação específica da parte de Deus (1Co 4.1; Ef 3.2; Cl 1.25).
5. Dispensação e era são conceitos correlatos, mas tais palavras não são corretamente intercambiáveis. Por exemplo, Paulo declara que a revelação da atual dispensação ficou oculta “desde os séculos” (Ef 3.9). A mesma coisa é dita em Colossenses 1.26. Entretanto, visto que uma dispensação se desenvolve em um período de tempo, os conceitos têm alguma inter-relação.
6. Pelo menos três dispensações (tal como normalmente se entende pelo ensino dispensacionalista) são mencionadas por Paulo. Em Efésios 1.10 ele escreve sobre “a dispensação da plenitude dos tempos”, que aparenta ser um período futuro. Em Efésios 3.2 ele fala da “dispensação da graça de Deus”, a qual era a tônica do conteúdo de sua pregação naquele tempo. Em Colossenses 1.25-26 fica implícito que outra dispensação havia precedido a atual na qual o mistério de Cristo no crente revelado.[7]

Deve-se notar que os dispensacionalista desdobraram o termo “dispensação”, de um modo semelhante ao uso bíblico do termo. Portanto, creio que o sistema teológico conhecido, no dias atuais, como dispensacionalismo é coerente com o ensino bíblico.

II - DEFINIÇÕES
Alicerçados nas observações bíblicas acima descritas, temos condições de definir o que é o dispensacionalismo. Segundo Ryrie, dispensação é “uma economia que distingue na composição operacional do propósito de Deus”. Além da definição de dispensação, Ryrie destaca: “se alguém estiver descrevendo uma dispensação, incluirá outros elementos, tais como os conceitos de revelação distinta, teste, fracasso e juízo”.[8] (Também conhecido como revelação, responsabilidade, fracasso e julgamento. Nota do autor: Luiz Gusmão). Por fim Ryrie faz a seguinte observação no que concerne a uma dispensação:

Os traços distintos são apresentados por Deus; os traços semelhantes são retidos por Deus; e o propósito global de todo o programa é a glória de Deus. Sauer a apresenta desta forma: ... um novo período sempre começa somente no momento em que uma mudança é introduzida, da parte de Deus, na composição dos princípios que eram válidos até aquele tempo; ou seja, quando da parte de Deus três coisas se combinam:
  1.    Uma continuação de outras regulamentações até então válidas;
  2.    Uma anulação de outras regulamentações até então válidas;
  3.    Uma apresentação recente de novos princípios que antes não eram válidos.[9]
Em sua obra clássica Dispensationalism Today, Ryrie formula esta ampla definição de dispensacionalismo:
O dispensacionalismo contempla o mundo como uma casa dirigida por Deus. Neste mundo-família, Deus está dispensando ou administrando seus negócios de acordo com a sua própria vontade nos vários estágios da revelação em progresso no tempo. Estes vários estágios demarcam as diferentes economias na composição operacional e Seu propósito total, e estas economias são as dispensações. A compreensão das diferentes economias de Deus é essencial para uma interpretação precisa de Sua revelação dentro de cada uma delas.[10]

Paul Nevin fez a seguinte síntese sobre o dispensacionalismo:
O método distinto de Deus no governo da humanidade ou de um grupo de pessoas durante um período da história humana, marcado por um evento crucial, um teste, um fracasso, e um juízo. Do ponto de vista divino, é uma economia, ou administração. Do ponto de vista humano, é uma mordomia, uma regra de vida, ou uma responsabilidade de administrar os negócios de Deus em Sua Casa. Do ponto de vista histórico, é um estágio no progresso da revelação.[11]

III – OS FUNDAMENTOS DO DISPENSACIONALISMO
Quem é dispensacionalista? São necessários parâmetros fundamentais pelos quais se possa aferir uma teologia. Quais são os fundamentos que caracterizam um dispensacionalista? Ryrie enuncia aquilo que ele chama de três fundamentos ou sine qua non (do latim: “sem a qual condição não”) do dispensacionalismo:
 Portanto, a essência do dispensacionalismo é a distinção entre Israel e a Igreja. Tal distinção procede do emprego coerente de uma interpretação normal ou comum por parte do dispensacionalista, e reflete uma compreensão do propósito básico de Deus em todos os Seus tratamentos com a humanidade, que é o de glorificar a Si mesmo através da salvação, bem como outros propósitos.[12]
Os três fundamentos não são uma definição ou descrição do dispensacionalismo, pelo contrário, são testes teológicos básicos que podem ser aplicados a um indivíduo com a finalidade de se checar se ele é ou não um dispensacionalista.

O Primeiro Fundamento: Interpretação Literal
Charles Ryrie - Defensor da cosmovisão
dispensacionalista. Professor em Dallas
Theological Seminay.
O primeiro fundamento do dispensacionalismo, segundo Ryrie, não é apenas uma interpretação [13]
literal, porém, mais integralmente, uma hermenêutica literal coerente. “O termo literal talvez seja tão próprio quanto o termo normal ou comum”, explica Ryrie, “mas, em todos os casos, é uma interpretação literal que não espiritualiza ou alegoriza como o faz a interpretação não-dispensacional”. A interpretação literal é fundamental para uma abordagem dispensacional das Escrituras. Earl Radmacher chegou ao extremo de dizer que a interpretação literal “é o saldo final do dispensacionalismo”.

O dicionário define a palavra literal como: “que diz respeito ou pertence às letras”. Também menciona que a interpretação literal implica uma abordagem “baseada em palavras reais que são interpretadas em seu sentido normal... não indo além dos fatos”.[14] “a interpretação literal da Bíblia consiste simplesmente em explicar o sentido original do texto bíblico de acordo com o uso normal e costumeiro da linguagem”.[15] Como isso é feito? Só pode ser realizado através de um método gramatical (de acordo com as normas da gramática), histórico (coerente com o cenário histórico da passagem), e contextual (em harmonia com o seu contexto). O literalismo atenta para o texto, considerando as palavras e frases de uma passagem. A interpretação não-literal importa uma idéia que não se encontra especificamente no texto de uma passagem. Até certo ponto, todos os hermeneutas interpretam a Bíblia literalmente. Entretanto, os dispensacionalistas o fazem de forma consistente (uniforme) de Gênesis a Apocalipse.

A interpretação literal reconhece que uma palavra ou frase pode ser utilizada explicitamente (sentido denotativo) ou figurativamente (sentido conotativo). No linguajar moderno, como também ocorre na Bíblia, nós falamos explicitamente – “a vovó morreu” (denotativo), ou falamos de modo pitoresco “a vovó bateu a botas” (conotativo). Um aspecto importante a ser ressaltado é que, mesmo utilizando uma figura de linguagem para referirmos à morte, usamos essa figura em referência a um evento que aconteceu literalmente. Ryrie declara:

Nesse método, todos os símbolos, figuras de linguagem e tipos são interpretados explicitamente e não são contrários, de modo algum, à interpretação literal. Afinal de contas, a própria existência de algum significado numa figura de linguagem depende da realidade do significado literal dos termos envolvidos. As figuras muitas vezes tornam o sentido mais claro, mas é o significado literal, normal, ou explícito que elas comunicam ao leitor.[16]

Alguns se enganam ao pensar que só pelo fato de uma figura de linguagem ter sido usada para descrever um evento (por exemplo, a experiência de Jonas no ventre do grande peixe em Jonas 2), tal evento não foi literal. Mas a questão não é essa. Uma “Regra Áurea da Interpretação” foi desenvolvida para auxiliar o intérprete a discernir se houve a intenção de uma figura de linguagem:

Quando o sentido explicito de um texto das Escrituras fizer sentido, não procure outro sentido; portanto, interprete cada palavra em seu significado primário, comum, usual, literal, a menos que os fatos do contexto imediato, estudados à luz de passagens correlatas e de verdades fundamentais axiomáticas, indiquem nitidamente o contrário.[17]

E. E. Johnson (do seminário Teológico de Dallas) registra que boa parte da confusão sobre o literalismo é dissipada quando se entendem os dois modos pelos quais o conceito é utilizado: “(1) O sentido explícito, claro, de uma palavra ou frase em contraste com um uso figurativo, e (2) um método que contempla o texto considerando que o mesmo oferece o alicerce da verdadeira interpretação”.[18] Portanto, os dispensacionalistas, de um modo geral, utilizam o termo “literal” para se referirem ao seu sistema de interpretação. (o uso coerente do método histórico-gramatical), e uma vez que se está dentro do sistema, o termo literal faz referência a se uma palavra ou frase específica é usada no sentido figurativo ou literal em seu contexto.

O segundo uso do termo literal, proposto por Johnson, (i.e., literalismo sistemático) é o simples emprego do método histórico-gramatical utilizado coerentemente. O método histórico-gramatical utilizado coerentemente. O método histórico-gramatical foi restaurado pelos reformadores e utilizado em oposição ao sentido alegórico (espiritualizado), dito “mais profundo”, do texto, muito frequentemente na Idade Média. O sentido literal era usado apenas como um trampolim para o significado mais profundo (espiritual), considerando mais agradável. Uma interpretação espiritualizada, que ficou famosa, é aquela que considera os quatro rios mencionados em Gênesis 2 – Pisom, Giom, Tigre e Eufrates – como representação do corpo, alma, espírito e mente. Abandonando tal sistema de interpretação, os Reformadores perceberam a necessidade de retornarem ao significado literal ou textual da Bíblia.

O sistema de interpretação literal é a abordagem hermenêutica histórico-gramatical ou textual. O uso do literalismo, neste sentido, pode ser chamado de “macro-literalismo”. No macro-literalismo, o uso coerente do método histórico-gramatical produz a conclusão interpretativa, por exemplo, de que o termo Israel sempre se refere exclusivamente ao Israel nacional. Se o método histórico-gramatical for coerentemente empregado, a Igreja não será substituída por Israel porque não há indicadores textuais de que seja esse o caso. Talvez alguém importe uma idéia externa ao texto, afirmando que a passagem realmente significa algo que, de fato, o texto não diz. Essa abordagem substitutiva é uma forma sutil de interpretação espiritual ou alegórica. É o que se constata por parte daqueles que substituem Israel pela Igreja, não interpretando a Bíblia literalmente e espiritualizando o texto, já que este ponto de visto se opõe a uma interpretação macro literal.
No microliteralismo pode haver discussão dos literalismo quando ao uso literal ou figurado de uma determinada palavra ou frase no contexto de uma passagem em questão. Naturalmente algumas passagens são mais claras do que outras, criando um consenso entre intérpretes, ao passo que outras passagens dividam os intérpretes literais quanto a se deveriam ser interpretadas como uma figura de linguagem ou não. Trata-se mais de um problema de aplicação do que de método.

O reconstrucionista Ken Gentry, em seu ataque ao literalismo, argumenta que “literalismo coerente é um absurdo”.[19] Ele tenta provar seu ponto de vista arrazoando que, só pelo fato dos dispensacionalistas interpretarem algumas palavras e frases como figuras de linguagem, “já não são coerentemente literais”.[20] Gentry afirma que “a pretensão dispensacional de literalismo coerente” é frustrada pelo seu emprego incoerente”.[21] Gentry procura desacreditar a hermenêutica dispensacionalista que interpretam certas passagens respeitando figuras de linguagem em seu conteúdo, utilizando tais citações como prova de incoerência quanto ao método de interpretação literal. Segundo Gentry, o dispensacionalista tem de abandonar a interpretação literal quando se dá conta de que Jesus se refere figuradamente a Si mesmo como uma porta em João 10.9.[22] (Entretanto) Gentry não está utilizando a mesma definição de interpretação literal sustentadas pelos dispensacionalistas. Portanto, suas conclusões sobre interpretação literal são mal orientadas porque normalmente mistura os dois sentidos propostos por Johnson. Quando fala do macro literal, Gentry utiliza um exemplo do microliteralismo, e vice-versa, parecendo, assim, que ele demonstrou uma incoerência na interpretação literal. Na verdade, seus exemplos estão dentro da mesma estrutura pela qual os dispensacionalistas definiram o que entendem por interpretação literal.
Este é o primeiro fundamento do dispensacionalismo. Um método de se abordar as Escrituras que permita, através do progresso da revelação, que as próprias Escrituras interpretem a si mesmas. O dispensacionalismo não aborda a Bíblia por meio de um esquema interpretativo fantasioso, cheio de simbolismos complexos que reduzem as Escrituras a um livro de códigos místicos, dependendo de um manual de decodificação para desvendá-la. O segundo fundamento decorre do primeiro. 


O Segundo Fundamento: A Distinção Entre Israel e a Igreja.
“Um dispensacionalista mantém a distinção entre Israel e a Igreja”, declara Ryrie. Ele também menciona que, se uma pessoa “falha em distinguir Israel da Igreja, inevitavelmente não conservará os distintivos dispensacionais; ao passo que aquele que fizer tal distinção os conservará”.[23] O que significa manter Israel distinto da Igreja? Os dispensacionalistas crêem que a Bíblia apresenta um único programa de Deus para a história, o qual inclui um plano específico para Israel e outro diferente para a Igreja. Dois povos estão no programa de Deus: Israel e a Igreja. John Walvoord diz que as “dispensações são normas de vida. Não são caminhos de salvação. Há somente um caminho de salvação, que é pela graça, por meio da fé em Jesus Cristo”.[24] Lewis Sperry Chafer, fundador e presidente emérito do Seminário Teológico de Dallas, descreveu a distinção da seguinte maneira:

O dispensacionalista crê que Deus, do começo ao fim da história, tem em vista dois propósitos distintos: um diz respeito a esta terra, no qual se incluem pessoas e objetivos terrenos, que é o judaísmo; enquanto o outro diz respeito ao céu, no qual se incluem objetivos celestiais, que é o cristianismo... Em oposição a isto, o dispensacionalista parcial, ainda que observe obscuramente algumas distinções óbvias, baseia a sua interpretação na suposição de que Deus está fazendo uma coisa, a saber, a separação geral dos bons e dos maus, e, apesar de toda a confusão que esta teoria limitada acaba criando, sustenta que o povo terreno se funde com o povo celestial; que o programa terreno deve ser analisado por uma interpretação literal ou desconsiderado por completo.[25]

Se as promessas feitas a Israel no Antigo Testamento se referem literalmente aos judeus, então é obvio que ainda aguardam seu cumprimento literal. Portanto, é evidente que o plano de Deus para Israel, que no presente se encontra disperso (Dt 4.27-28; Dt 28.63-67; Dt 30.2.4), está em espera até que Ele complete Seu propósito atual com a Igreja, que é o de separar dentre os gentios um povo para o Seu nome (At 15.14), e arrebatar a Sua Noiva para o céu. Após o Arrebatamento, Deus completará o Seu acordo inacabado com Israel (At 15.16-18) durante o período de sete anos da Tribulação. Assim, se alguém não distingue as passagens nas quais Deus fala a Israel daquelas as quais Ele dirige à Igreja, o resultado é uma fusão indevida de dois programas distintos.

Carlos Osvaldo Pinto - erudito professor bíblico, de cosmovisão
dispensacionalista. Leciona há anos no Seminário Bíblico
Palavra da Vida.
No Antigo Testamento, Deus fez certas promessas a Abraão, empenhando Sua Palavra em fazer dele o pai de um povo especial. Os dispensacionalistas entendem essas promessas, e outras promessas incondicionais da aliança (i.e. concessões pactuais) feitas por Deus a Israel, como sendo ainda para Israel, mesmo que a Igreja possa compartilhar de algumas bênçãos espirituais (Rm 15.27). No final, Deus não somente restaurará Israel a uma posição de benção (Rm 11), mas também cumprirá literalmente as promessas de uma terra e de um reino feitas a Israel nas alianças Abraâmica (Gn 12.1-3), da Terra de Israel (Dt 30.1-10) e Davídica (2 Sm 7.12-16). No atual momento, Deus tem outro plano concernente a Igreja, que difere de Israel (Ef 2-3). Os dispensacionalistas não crêem que a Igreja é o Novo Israel ou que tenha substituído Israel como a herdeira das promessas do Antigo Testamento. Ao contrário de alguns, que dizem que a Igreja suplantou Israel, em nenhum lugar o Novo Testamento chama a Igreja de Israel. Os dispensacionalista Arnold Fruchtenbaum declara:

A conclusão é que a Igreja nunca é chamada de Israel espiritual ou de novo Israel. O termo Israel é utilizado numa referência à nação ou ao povo como um todo, ou ainda ao remanescente crente dentre o povo. Ele nunca é usado numa referência à Igreja em geral, nem aos crentes gentios em particular. Na realidade, mesmo depois da cruz, ainda permanece uma tripla distinção. Primeiro, há uma distinção entre Israel e os gentios, conforme consta em 1 Coríntios 10.32 e Efésios 2.11-12. Por último, há uma distinção entre os crentes judeus (o Israel de Deus) e os crentes gentios Romanos 9.6 e Gálatas 6.16.[26]

Fruchteembaum aponta seis razões pelas quais o Novo Testamento mantém a distinção entre Israel e a Igreja. São elas:
  1. A Igreja nasceu em Pentecostes, enquanto Israel já existia há muitos séculos...
  2. Certos eventos no ministério do Messias foram essenciais para o estabelecimento da Igreja – a Igreja não veio à existência até que certos eventos ocorressem...
  3. O caráter de ministério da Igreja...
  4. A Igreja, distinta de Israel, é o relacionamento singular entre judeus e gentios, que se denomina “um novo homem” em Efésios 2.15...
  5. A diferença entre Israel e a Igreja encontra-se em Gálatas 6.16 (i.e., “o Israel de Deus”)...
  6. No livro de Atos, tanto Israel quanto a Igreja existem simultaneamente. O termo Israel ocorre vinte vezes e o temo ekklesia (i.e., “igreja” dezenove vezes, todavia os dois grupos são sempre distintos.[27]
 O Terceiro Fundamento: O Propósito da História é a Glória de Deus
O terceiro fundamento do dispensacionalismo também gira em torno de outra importante distinção. Showers afirma que esse “fator indispensável é o reconhecimento de que o propósito final da história é a glória de Deus, através da demonstração de que somente Ele é o Deus soberano”.[28] Ryrie explica:

 Reconhecemos que o princípio unificador da Bíblia é a glória de Deus e que ela é levada a efeito de vários modos o programa da redenção, o progrma para Israel, o castigo dos ímpios, o plano para os anjos, e a glória de Deus revelada através da natureza. Consideramos todos estes programas como meios de glorificar a Deus, e rejeitamos a acusação de que, ao fazermos distinção entre eles (particularmente entre o programa de Deus para Israel e o Seu propósito para a Igreja), provocamos uma bifurcação no propósito de Deus”.[29]

Este fundamento é um dos menos entendidos e, muitas vezes, é considerado de menor importância. Creio que seja o um fundamento válido e convincente, quando corretamente compreendido. Os dispensacionalistas não estão dizendo que os não dispensacionalistas não crêem na glória de Deus. Fazemos questão de dizer que a compreensão dispensacionalista do plano de Deus significa que Ele é glorificado na história em muitas outras áreas ou facetas, diferindo daquele que vêem a salvação da humanidade (provavelmente o aspecto mais importante do plano de Deus) como única área que exibe a glória de Deus.

 IV – UMA FILOSOFIA BÍBLICA DA HISTÓRIA
Showers menciona que uma perspectiva dispensacional da Bíblia capacita o crente a ter uma filosofia bíblica da história.[30] Isso é importante porque, quando entendemos o propósito de Deus para cada era da história, podemos desenvolver uma visão de mundo que nos permita viver de acordo com a vontade de Deus em cada dispensação. Quem tem uma perspectiva divina do passado, do presente e do futuro é capaz de saber o que Deus espera dele em cada área de sua vida. Na era atual da Igreja, o Novo Testamento nos instrui em todas as esferas de nossa vida, tanto na esfera particular quanto na pública. Por exemplo, o dispensacionalista não vive nesta era da graça como se ainda estivesse sob o domínio da Lei Mosaica. Pelo contrário, agora ele tem consciência de que está sob o domínio da Lei de Cristo.

 V – CONCLUSÃO
Creio que o dispensacionalismo é um sistema de teologia que se desenvolveu a partir da própria Bíblia. O dispensacionalismo é crucial para que se entenda corretamente a Bíblia, em especial, a Profecia Bíblica. Ninguém será capaz de manejar “bem a palavra da verdade”, a Bíblia, se não compreender essas grandes verdades. O Dr. Ryrie conclui:

 Se alguém não interpreta a Bíblia desta maneira, isso quer dizer que tal pessoa vai conseguir mutilar algumas de suas partes? De jeito nenhum. Para falar a verdade, a Bíblia está mais viva do que nunca. Não há necessidade de se evitar o sentido explícito de uma passagem, de reinterpretá-la ou de espiritualizá-la, para que os conflitos com outras passagens sejam resolvidos. As ordens e padrões de Deus para minha vida, hoje, tornam-se cda vez mais distintos, e Seu plano, em seu desenvolvimento esplendoroso, termina num arranjo harmonioso. A história do dispensacionalismo está repleta de homens e mulheres que amam a Palavra de Deus, promovem o seu estudo, e se sentem responsáveis por pregar o Evangelho ao mundo inteiro.[31]

Nota do tradutor: Meus sinceros agradecimentos ao Sr. Thomas Ice, por seus artigos publicados para o Pre-Trib Reserch Center (Centro de Pesquisas Pré-Tribulacionistas) Arlinton, Texas. A presente apostila é na verdade uma dívida dos seus ensinamentos nos referidos artigos, aos quais tive a oportunidade de traduzi-los na época do meu curso de mestrado no Antigo Testamento. [32]


[1] Charles C. Ryrie, What is Dispensationalism? (folheto publicado pelo Seminário Teológico de Dallas, 1980, 1986, p. 1.
[2] Walter Bauer, A Greek- English Lexicon of the New Testament and Other Early Christian Literature. Uma tradução de Willian F. Ardnt & F. Wilbur Gingrich, Chicago, The University of Chicago Press, 1957, p. 562.
[3] Ryrie, Ibid
[4] Charles C. Ryrie, Dispensationalism Today. Chicago, Moody Press, 1965, p. 25.
[5] Ibid., p. 26.
[6] Charles C. Ryrie, Dispensationalism Today. Chicago, Moody Press, 1965, p. 26.
[7] Charles C. Ryrie, Dispensationalism Today. Chicago, Moody Press, 1965, p. 26-27.
[8]  Charles C. Ryrie, Dispensationalism Today. Chicago, Moody Press, 1965, p. 29.
[9]  Ibid., p. 30.
[10] Ibid., p. 31.
[11] Paul David Nevin, Some Major Problems in Dispensational Interpretation. (Dissertação de doutorado em Teologia, Seminário Teológico de Dallas), 1965, p. 97.
[12] Ryrie, Dispensationalism Today, p. 47.
[13] Earl D. Radmacher, The Currrent Status of Dispensationalism, and its Escatology. Editado por Kenneth S. Kantzer e Stanley N. Gundry em Perspectives on Evagelical Teology, Grand Rapids, Baker, 1979,  p. 171.
[14] Webster’s New Twentieth Century Dictionary (Completo), Segunda Edição, p. 1055.
[15] Paul Lee Tan, The Interpretation of Profecy. Winona Lake, Assurance Publishers, 1974, p. 29.
[16] Ryrie, Dispensationalism Today,  pp. 86-87.
[17] David L Cooper, The Word’s Greatest Library: Graphically Illustrated. Los Angeles, Bíblical Reserch Society, 1970, p. 11.
[18] Elliot E. Johnson, Exporitory Hermeneutics: An Introduction. Grand Rapids, Zondervan, 1990, p.9.
[19] Kenneth L. Gentry, Jr., He Shall Have Dominion: A Postmillenial Eschatology. Tyler, Tex., Institute For Christian Economics, 1992, p. 148.
[20] Para exemplos de sua abordagem, veja Ibid., PP. 153-158.
[21] Kenneth L. Gentry, Jr., He Shall Have Dominion: A Postmillenial Eschatology. Tyler, Tex., Institute For Christian Economics, 1992, p. 153.
[22] Ibid., p. 148.
[23] Ryrie, Dispensationalism Today,  pp. 44, 45.
[24] John F. Walvoord, “Biblical Kingdoms Compared and Contrasted”, publicado em Issues in Dispensationalism. Editado por Wesley R. Willis e John R. Master, Chicago, Moody Press, 1994, p. 88.
[25] Lewis Sperry Chafer, Dispensationalism. Dallas, Seminary Press, 1936, p. 107, conforme citado em Ryrie, Dispensationalism Today, p. 45.
[26] Arnold G. Fruchtenbaum, “Israel and the Church” publicado em Issues In Dispenationalim, p. 126.
[27] Arnold G. Fruchtenbaum, “Israel and the Church” publicado em Issues In Dispenationalim, pp. 116-118.
[28] Showers, There Really Is a Diference!, p. 53.
[29] Ryrie, Dispensationalism Today, pp. 211-212.
[30] Showers, There Really Is a Diference!, pp. 49-52.
[31] Ryrie, What Is Dispensationalism?, p.7.
[32] Luiz José de Almeida Gusmão. M. Teol.

Link completo da fonte:
http://www.leiajornal.com.br/index.php?pagina=posts&id=40&tipo=Estudos+B%EDblicos

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