terça-feira, outubro 25, 2011

A Utilidade da Decepção

Por Thomas Tronco

Meu primeiro ano na faculdade de odontologia, dezenove anos atrás, foi um tempo marcante em todos os sentidos. Em primeiro lugar, havia uma enorme euforia de estar na faculdade aprendendo teorias e técnicas que me acompanhariam profissionalmente no futuro e abririam portas de um trabalho missionário. É claro que, com isso, a expectativa da formatura já começava a abrasar o coração inquieto. Depois, cresceu em mim um sentimento de responsabilidade, já que as matérias eram muito difíceis, exigindo o máximo empenho dos alunos, e a quantidade de livros, apostilas e roteiros a serem estudados era, às vezes, tão grande, que tornava difícil o seu transporte.

Contudo, meu primeiro ano também foi marcado por um sentimento de extrema derrota. Isso porque uma das duas matérias semestrais que tive terminou com um resultado negativo. Na primeira prova, ainda não adequado ao ritmo universitário, obtive uma nota muito difícil de recuperar. Decidido a mudar esse quadro, dediquei-me de tal maneira que estava certo de que viria a comemorar tão logo visse meu nome no quadro de notas. Mas, apesar de ter ido bem na prova, não deu! O dano causado na primeira prova tornou muito difícil a recuperação na segunda. Lembro-me, como se fosse hoje, da decepção que senti.

Infelizmente, a decepção não costuma andar sozinha. A desesperança é sua companheira de viagem. Era ela que eu carregava diariamente ao enfrentar as dificuldades das outras matérias. Como eram matérias anuais, o início, não muito convincente, podia ser revertido em aprovação. Mas quem disse que havia em mim esperança de conseguir? Eu pensava: “Se fracassei na primeira matéria, por que não fracassaria também nas outras? Se fui incapaz de passar naquelas provas, de onde tirei a ideia de que sou capaz para qualquer coisa?”. Fui consumido muito tempo por essa tristeza, amargura e frustração.

Como reação natural ao medo do fracasso, criou-se em mim a mentalidade acadêmica que pudesse cumprir as responsabilidades de estudo, de horários, de presença, de realização de trabalhos e da humildade necessária para saber como se postar ante o ensino. Contra minhas expectativas, fui aprovado nas três disciplinas que eu achava que não seria capaz de vencer, todas elas por um décimo de ponto a mais do que a nota de que eu necessitava.

O misto de sentimentos que tive ao longo das férias de verão, tanto de alegria pelo êxito como de incerteza sobre a capacidade pessoal, me fez voltar uma nova pessoa no ano seguinte. Aproveitei o melhor que pude o restante do curso, comprometendo-me além do exigido. A verdade é que o modo como passei a lidar com o aprendizado e com a responsabilidade pessoal me acompanha até hoje, pelo que nunca deixarei de ser grato pela minha derrota inicial e por toda a decepção que senti. Sempre agradeço a Deus pela preciosa lição com a qual ele me modelou.

Perece ter sido essa a mesma experiência de Pedro que, depois de afirmar orgulhosamente que nunca negaria a Cristo, chegando até mesmo ao ponto de morrer com ele (Mt 26.33-35), teve o desprazer de negar seu Mestre três vezes diante de serviçais (Mt 26.69-74). Consigo entendê-lo perfeitamente quando Mateus narra: “E, saindo dali, chorou amargamente” (Mt 26.75). Também sei o efeito que a atuação inesperada, mas restauradora, do chamado de Cristo por meio dos anjos tem: “Mas ide, dizei a seus discípulos e a Pedro que ele vai adiante de vós para a Galileia; lá o vereis, como ele vos disse” (Mc 16.7). Chamar Pedro pelo nome foi a confirmação de que ele não havia sido rejeitado e que podia por de lado a decepção e continuar. O final da vida de Pedro foi em uma cruz, com sua cabeça virada para baixo, confessando pública e ousadamente a fé no seu Senhor.

Impressionante! Quantas vezes tenho de lembrar dessa lição para não ser consumido pela decepção, frustração, desesperança e pela sensação de fracasso e incapacidade. Contudo, a lição de Deus me enche de forças, pois sei que ele está comigo; enche-me de esperanças, pois já o vi tomar-me pela mão e me erguer; enche-me, também, de conforto, pois aprendi de fato a preciosa, humilhante e encorajadora lição. Nas mãos de Deus, até a desilusão tem sua utilidade!

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